segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Aniversário

Ai, aniversário...

Ainda não descobri porque, mas não gosto muito dessa coisa de comemorar aniversário - fico sem graça, sem palavras, sem ação. Ainda hoje em dia tem essa coisa de orkut, facebook, blog, e sei lá mais o que, e dá pra resolver com um recadinho e mandar beijinhos e ótimo, mas "no meu tempo" tinha aquela coisa de falar no telefone e ir até em casa e mandar cesta de café da manhã e fazer surpresa na hora que acorda... e eu acordo de mau humor! Parece até que tudo ficava pior em vez de melhorar (rs). Lembro uma vez que os colegas de trabalho inventaram uma festa surpresa logo pela manhã e quase morrem de medo da minha reação, não sabiam se eu ia ficar feliz ou bater em todo mundo por gritar PARABÉNS no meu ouvido logo cedo. E nem é pelo mau humor da manhã, mas pela falta de jeito de aceitar estes pequenos mimos que as pessoas me oferecem.

E parece que quanto mais eu fujo das comemorações mais elas aparecem! E tem sempre alguém que me faz uma surpresa inesquecível. Acho que meu coração está ficando mole e os anos acumulados estão me ensinando a aceitar o inevitável. No meu primeiro aniversário do trecho minha mãe me mandou uma caixinha com um presente muito simples e um breve cartão - foi o suficiente para me fazer chorar por horas... Nesse final de semana eu me comprometi a fazer um bolo de sobremesa para um almoço com o pessoal aqui da rua no sábado, mas aí apareceu vela e máquina fotográfica e mais uma surpresa de aniversário.

Por curiosidade procurei no google e apareceu: Aniversário é uma palavra latina que significa "aquilo que volta todos os anos". Anniversarius vem de annus (ano) e vertere (voltar), ou seja, aquilo que se faz ou que volta todos os anos. E aí é que fica interessante, pois a vida me deu aniversários completamente diferentes um do outro. O meu único ritual neste dia é ficar um pouco só e pedir ao meu DEUS paz, força e tudo mais que preciso para um ciclo que se inicia. Acendo uma vela para Ele me iluminar e me proteger.

Afinal, fazer aniversário é mais um ano que começa para fazer novos amigos, ajudar mais pessoas, aprender novas lições, conhecer outros lugares e aceitar aquilo que não posso mudar. Sorrir para novos e velhos motivos, rezar mais preces, amadurecer e olhar a vida como um presente de Deus.  E ser grata.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Frio

Bagé, até hoje, foi o trecho que menos gostei. Quando penso em frio é lá mesmo que vou parar! Não consigo nem imaginar como deve estar frio por lá. Morei por seis meses num apartamento no centro da cidade e nunca passei tanto frio por tanto tempo. Já estive em alguns lugares de muito frio para passear, mas morar num lugar que é extremamente gelado não combina comigo.

A cidade tem uns 130 mil habitantes, tem um monte de universidades e milhares de estudantes espalhados por todos os lados. Historicamente falando é uma região muito interessante e importante. É região de fronteira, fica beeem perto do Uruguai e o exército está presente em todos os seus subtipos, cores e nomes, além dos jatos em treinamento, da cavalaria passeando pelas ruas e dos quartéis em todas as esquinas.

No início tudo é romântico, bonito, interessante e aí começa ficar repetitivo e cansativo. Daí não consigo mais esquentar o corpo, nem dá vontade de sair de casa ou coragem para tomar banho (afff...). O vinho é necessário para sobreviver, parece que os ossos só esquentam depois de duas taças de vinho – tava até me sentindo meio alcoólatra, quando saí de lá percebi que é o clima mesmo. Além de frio, Bagé tem muito vento – um vento solto, como diz meu sogro – e a noite as janelas tremem tanto que vc tem certeza que elas vão voar. Com o tempo a gente acostuma e dorme! As duas taças de vinho ajudam nessa hora também...

Como sempre vejo o lado bom, posso afirmar que foi a cidade que tem o povo mais bonito que já vi: aquele monte de gente jovem, estudantes, bem vestidos, com muitos acessórios de frio, divertidos, alegres e festeiros. Nem dava para imaginar um lugar tão frio e tão animado. Como a mão de obra da cidade é abastecida pelos estudantes, em qualquer loja ou restaurante tem sempre alguém muito bonito e simpático te servindo, e quando a gente diz obrigada eles respondem “tu mereces”. É um exagero de bom humor e beleza!

É interessante ver como o clima de cada cidade reflete no seu cotidiano, muda a vontade de fazer as coisas, a cor da pele das pessoas, o grau de escolaridade, de simpatia, de cultura e até de tradicionalismo. Um dia, há muito tempo, achei que tudo isso fosse folclore, invenção, maldade do povo. Mas acredite o Brasil realmente tem os seus extremos.

E cada vez mais agradeço por estar no trecho, pois da mesma forma que esfria, pode esquentar!

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Chuva

Tá chovendo lá fora. E o que isso tem a ver com o trecho? Tudo. Olhar a chuva lá fora me faz observar através da janela e me ajuda a lembrar que estou longe de casa. Ainda chamo São Paulo de casa. Não pela cidade, mas pelas pessoas que estão lá – minha família. Sei que minha casa, hoje, é Mucuri, mas é difícil esquecer de onde nasci. Não tenho vontade de voltar a morar em SP e se puder escolher não volto tão cedo para isso, até porque quando chove em SP tudo fica pior!

A chuva aqui na praia é diferente. O céu, o cheiro, as gotas que caem. E em cada lugar é diferente. A chuva me situa no trecho. “Onde estou?” Estou em casa. Olho para os móveis, para a cadela dormindo em sua cama, o vaso de plantas que me acompanha em todas as casas. Tudo é meu, tudo tem minha cara, foi escolhido por mim. E aí me pergunto – onde é minha casa?

A reflexão é inevitável, e aqui quando chove a energia costuma acabar. Mais uma indicação do trecho, Mucuri = chuva sem energia. Em outros lugares a chuva era sinônimo de vento forte, ou de ruas inundadas, ou de chuva dentro de casa. Aqui é só tranqüilidade. Os pássaros tomam banho no meu gramado, as formigas se escondem e minha cadela continua dormindo.

Bom mesmo aqui é tomar banho de chuva! Se estou na rua não me importo de me molhar, parece que faz parte do ritual. Mas isso é aqui em Mucuri. Em outras cidades a chuva era fria demais, a roupa era importante demais, o tempo era curto demais. Aqui nada disso faz sentido.

Chego à conclusão que tudo é fugaz, passageiro. Há um ano eu estava numa cidade extremamente fria e quando chovia esfriava ainda mais. Há dois anos eu estava numa cidade que não chove nesta época do ano, e fica sem chuva por uns dois ou três meses. Como será a chuva do ano que vem? Ô chuuuvaa, só peço que caia devagar...

domingo, 8 de agosto de 2010

Churrasco

Já tive experiências sensacionais que envolveram churrasco, do mais espetacular, com carnes exóticas e local paradisíaco até aquele que dá vontade de esquecer. Churrasco de família, de trabalho, de fim de ano, de aniversário e principalmente de despedida – uma boa despedida só é válida se tem churrasco. Parece que é a coisa mais fácil de fazer, mas dá um trabalho imenso. Então por que churrasco?

Sempre fui uma apaixonada por churrasco. Não exatamente pela carne queimando, mas por todo o resto: o cheiro, a música, a risada, a descontração e toda a atmosfera que o carvão provoca. Até o pior de todos justifica a reunião. Churrasco tem magia, mexe com a gente, desperta aquela coisa que vem dentro de vc e que de vez em quando precisa sair para tomar um ar. Conheci gente que nem comia nem bebida durante o churrasco, ia mesmo só pra ver as pessoas e também conheci alguns que só iam para comer e beber, ficavam uns 10 minutos, nem falavam com ninguém e iam embora. Perfeito! Todo mundo se encaixa e fica feliz.

No trecho tudo é sinônimo de churrasco, até porque a quantidade de homens que podem disputar a churrasqueira ajuda. Em Três Lagoas era assim: começava na quarta-feira para poder acompanhar o truco e ai sobrava carne ou cerveja e tinha que finalizar na sexta, que emendava o sábado e várias vezes o domingo. De vez em quando tinha um aniversário na segunda, ou uma comemoração qualquer na terça e aí queridos, danou-se. E o churrasco vem sempre com uma variedade de outras coisinhas: vinagrete, pão, farofa, saladas diversas e sem contar o refrigerante, a cachaça, a cerveja, as caipirinhas e socorro! Ah, e tem a música! O básico é o pagode mesmo, o sambinha que todo mundo canta, aqueles bem populares, meio antigos, mas vai além, tem funk carioca, sertanejo e qualquer tipo de música popular brasileira (ou não) que possa ser acompanhada, reconhecida e curtida. Se a música for ao vivo então ai sim é o churrasco perfeito e todo mundo se entrega, até quem não gosta de nada daquilo. Churrasco com música desconhecida não dá liga!

Alguns episódios foram muito marcantes, não só em Três Lagoas, mas em todos os trechos. Teve um inesquecível, uma despedida (claro!) que durou por mais de 16 horas seguidas, numa casa espetacular, num gramado na beira do rio Paraná, com todas as carnes que se possa imaginar e bebidas que nem posso imaginar e com a maior rotatividade de pessoas que já presenciei. Foi lindo! Todos os trecheiros apareceram em algum momento e coisas bizarras, engraçadas e emocionantes aconteceram. O pôr do sol foi incrível, a quantidade de pessoas animadas foi incrível e quantidade de cerveja consumida foi incrível. Nunca tinha visto nada igual num churrasco.

Teve uma infinidade de confraternizações com churrasco, e também teve churrasco na calçada, na beira do rio, no meu aniversário e nos outros muitos aniversários e todos as datas comemorativas. E teve aquele churrasco só meu e do meu marido, que a gente sentava ao lado da churrasqueira, tomava cerveja, curtia o dia – simples, rápido e tranquilo!

Definitivamente churrasco e o trecho têm tudo a ver e acreditamos tanto nisso que absolutamente tudo é motivo para churrasco!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Mudança

Três Lagoas é uma cidade pequena, com mais ou menos 100 mil habitantes e que por vários anos teve como principal atividade a Usina Hidroelétrica de Jupiá, no rio Paraná, na divisa entre SP e MS. Três Lagoas é a primeira cidade do MS para quem atravessa a divisa sentido a capital do estado, ou então sentido Pantanal. Por ali também dizem que é a terra do “rei do gado” e realmente a quantidade de fazendas de criação de boi é assustadora, para onde se olha se vê boi. Inclusive a cidade de Três Lagoas nasceu e cresceu por causa duma feira agropecuária local e por muitos anos viveu disso. Para mim era o fim do mundo para morar, não tinha nada a ver comigo, mas lá estava eue encarei a mudança.

A obra que me trouxe a cidade é a maior fábrica de celulose do mundo e por isso aproximadamente 5 mil pessoas de fora invadiram Três Lagoas em poucos meses. A princípio eu tive muitas chances de trabalhar na tal obra e só saí de SP com a certeza de que isso aconteceria. Quando cheguei lá senti que não era bem isso que eu queria e o meu mundo caiu! Me perdi e achei que tudo ia dar errado e então comecei a refletir sobre o que me deixaria feliz e ocupada. Ser dona de casa é legal, mas viver só em casa é impossível! Num rompante de iluminação fui procurar os meus desejos mais profundos e cheguei à conclusão que o que eu mais queria era trabalhar com crianças, se possível dar aulas e fui me virar. Sou formada, pós-graduada, trabalho desde os 16 anos, mas senti que nada disso me ajudaria nesse momento, e aí mais uma vez o meu desejo se tornou realidade...

Três meses depois de ter chegado à cidade eu já era professora de artes na melhor escola local! Cidade pequena é assim: vc comenta com uma pessoa que conversa com outra que questiona mais alguém e que sabe dum outro que precisa exatamente daquilo que vc está oferecendo. Até parece combinado, mas não é. A corrente acontece assim mesmo. Eu adorei: crianças mimadas e sedentas por informação me assistiam diariamente. Transformei isso numa paixão, fucei internet, cacei todas as minhas fontes, lembrei de todos os meus exercícios da faculdade, inventei aula, comprei livro e fui estudar sobre o assunto. Foi o melhor trabalho da minha vida, e ainda sobrava muitas horas de descanso diário - ou melhor, de horas vagas para serem preenchidas!

Para completar minha agenda fiz tudo que a maioria das mulheres gostaria, fiz aulas de tudo: pilates, teclado, arte-terapia, artesanato de todos os tipos... Fazia compras no centro diariamente, vivia no salão e fazia drenagem linfática e limpeza de pele e manicure e cabelo... Aprendi mil receitas de pães, bolos, doces, salgados e pratos diversos... Enquanto isso meu marido trabalhava 12 horas por dia, 7 dias por semana e às vezes 30 dias por mês - e esse era o motivo principal para não querer trabalhar com a obra, eu queria sim uma ocupação, mas eu queria mais do que isso!

Hoje eu uso os trechos para aprender novas habilidades e explorar novos mundos. Vivo cada dia descobrindo aptidões escondidas, paixões adormecidas e desejos reprimidos. E nas horas realmente vagas aproveito para ser feliz!

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Pessoas

Preciso falar um pouco sobre isso. Apesar de não sofrer pelas pessoas que vão, ou então quando eu mesma vou embora, quero deixar registrado que as pessoas que passaram pela minha vida de trecho ou antes do trecho foram importantes para mim. Conheci pessoas que realmente fizeram valer a pena cada minuto vivido ao lado delas. 

Eu sempre fui muito crítica comigo mesma e com todos ao meu redor, consigo enxergar defeitos e qualidades que a maioria das pessoas deixa passar, consigo identificar muitas características pessoais nas pessoas e talvez seja um dom. Não uso isso para me aproximar ou afastar das pessoas, eu apenas sinto.
Ao longo dos anos conheci pessoas realmente especiais e quando estamos no trecho essa aproximação é muito mais fácil, pois todos estão perdidos num lugar novo, numa cultura nova e com tudo diferente. E daí surgem os elos para que todos consigam viver melhor. Qualquer fim de tarde, almoço de domingo ou feriado nacional é um grande motivo para reunir 4, 10 ou 50 pessoas para uma mesma ocasião, normalmente acompanhada de música, bebida e comida. Passei por momentos incríveis sambando na varanda de uma casa minúscula de sítio, atravessando a cidade a pé com 80 crianças, jogando truco debaixo de uma árvore, roubando manga do vizinho, vendo o por do sol na beira do rio, fazendo churrasco na calçada e passando o Natal, pela primeira vez, longe da minha família - ou melhor, da minha família de sangue (qualquer dia eu conto essa do Natal) .

Não só os companheiros de trecho, mas também as pessoas que nos acolheram ao longo destes anos me ensinavam demais e me ajudavam a viver melhor. Para alguns ser de fora é ser do bem, é aquele que te abre o horizonte que te leva para novos desafios, para outros ser de fora é te mostrar o que vc é e o que vc não pode ser – e ai dói. Senti muito preconceito não só por ser de SP, mas também por milhões de outros motivos e sei que isso fará parte de minha vida enquanto o trecho for a minha vida. Só da forma que a pessoas afirma: “Você não é daqui, né?!”, já dá para sacar se vai ser “namoro ou amizade” – às vezes nem amizade!

É incrível como alguns desconhecidos podem se transformar em amigos de infância em tão pouco tempo, a carência do trecho é tanta que mesmo os mais complicados e estanho se acertam e cada vez mais acredito que os mais complicados e estranhos é que mais se dão bem neste tal trecho. Tudo tem data para acabar: o trabalho, a casa, as atividades extras – e claro, o convívio com aquele grupo. É bem possível que em algum outro trecho alguns se reencontrem, mas aí já mudou todo o resto e por incrível que parece já é o suficiente para que nada seja como antes e tudo que parece insignificante no dia a dia pode ser um sintoma: mais pessoas, menos pessoas, a cultura local, a equipe de trabalho e até o clima!

Cheguei a conclusão que gente precisa de gente para viver, é impossível ser só e por isso quero homenagear cariocas, gaúchos, curitibanos, sul-mato-grossenses, paraibanos, mineiros, paranaenses, cearenses, baianos, paulistas e paulistanos, capixabas, chilenos, finlandeses e todas as outras raízes possíveis que eu tenha me esquecido. Amo todos vcs e os guardo dentro do meu coração.